11.8.15

O Windows 10 e o fim da privacidade

O que o Windows 10 significa para o usuário ou consumidor?

Basta ler o primeiro tópico da Declaração de Privacidade da Microsoft (Dados pessoais que coletamos) para começar a compreender por que o Windows 10 está sendo chamado de privacy nightmare (em tradução livre, "pesadelo da privacidade"). Se você ainda não leu, leia agora. Para instalar o Windows 10 você precisa aceitar sua licença, e ao aceitar a licença do Windows 10 você está autorizando seu sistema operacional a capturar e enviar para a Microsoft o que você escreve, fala ou filma, além de uma série de outras informações. A palavra genérica que designa essa coleta de dados é telemetria (telemetry). 

Diante disso, a comunidade hacker está zelando pelos interesses dos usuários e fazendo um esforço para desabilitar o serviço de telemetria. O problema é que ninguém sabe até que ponto esse esforço será bem sucedido, e por duas razões. 

[A] A engenharia reversa de um sistema complexo como o Windows está longe de ser algo corriqueiro, mesmo para hackers experientes. Ou seja, não se sabe ao certo até que ponto será possível desligar de fato a espionagem coleta de dados da Microsoft. Algumas iniciativas parecem promissoras, como a exclusão do aparato de telemetria já nos arquivos de instalação do Windows. No entanto, como veremos a seguir, é possível que nem mesmo esse recurso extremo seja uma garantia de sucesso.

[B] Qualquer modificação introduzida pelo usuário poderá ser desfeita, pois a Microsoft simplesmente retirou de seus usuários a liberdade de aceitar ou não as atualizações do sistema.(¹) Isso equivale a dizer que qualquer modificação efetuada pelos esforços da comunidade hacker poderá ser revertida pela Microsoft com uma simples atualização compulsória do sistema via Windows Update. Por exemplo, se o usuário está usando uma cópia personalizada do Windows (sem telemetria), a Microsoft poderá simplesmente instalar (ou reinstalar) o componente.

Em resumo,o Windows 10 é uma máquina de coleta de dados pessoais que somente um usuário avançado pode tentar controlar, mas sem nenhuma garantia de sucesso. Rodar o Windows 10 significa que você simplesmente abdicou do controle de seu computador e de seus dados pessoais.

Por que a privacidade é tão importante?

O Windows não roda apenas em computadores pessoais e você não é o único "doador" potencial de informações a respeito de si mesmo. A Microsoft também recebe seus dados de outras empresas e passa adiante os dados que já possui. Além disso, uma infinidade de instituições – escolas, hospitais, órgãos do poder judiciário, bancos, administradoras de cartão – possuem informações sobre você. E se todos os computadores dessas instituições migrarem para o Windows 10?

"E daí? Eu sou um zé-ninguém e duvido que alguém realmente se importe com o que eu faço ou deixo de fazer." Pode ser; mas quem assim raciocina não entendeu que a acumulação de dados relativos a centenas de milhões de pessoas ultrapassa a esfera meramente "pessoal" de cada uma delas. Eu mesmo jamais usei chapéu de alumínio e nunca cheguei a perder o sono pensando na minha privacidade... Só que o ponto não é esse. Se houvesse alguma garantia de que essa massa de informações será usada apenas para fins comerciais, estaria tudo ótimo. O problema é que não há e nem pode haver qualquer garantia nesse sentido. Quem tiver acesso aos dados também estará em condições de definir com que finalidade eles serão usados.

E agora? Que fazer diante do Windows 10? 

Seja por ignorância, seja (mais provavelmente) por interesse, a imprensa e os sites especializados do Brasil celebram "a volta do menu iniciar" e evitam cuidadosamente todos os temas polêmicos. Um deles chegou a instar o leitor a fornecer seu email à Microsoft (num contexto em que isso é puramente opcional) e a afirmar que "a atualização é totalmente gratuita", aparentemente sem perceber que o uso do "totalmente" denuncia o artigo como simples peça de propaganda.

Ironicamente, as versões do Windows 10 oferecidas gratuitamente para o usuário doméstico (Home e Pro) não valem absolutamente nada. Apenas a versão "Enterprise", muito mais cara, permite ao administrador algum controle sobre o sistema. E como eu já adiantei no dia do lançamento do Windows 10, apenas a edição Enterprise LTSB (Long Term Servicing Branch) chega a ser realmente interessante: concebida para uso em ambientes sensíveis a falhas, ela não inclui "Apps", "Windows Store", "Edge" e "Cortana". Embora ainda precise de muitos ajustes de privacidade, é a edição mais promissora entre todas. No entanto, dificilmente um usuário doméstico terá condições financeiras (ou vontade) de comprá-la.

Mas as alternativas estão aí. O Windows 7 continuará sendo atualizado até janeiro de 2020, e o Windows 8.1, até janeiro de 2023. E até 2023, muita coisa pode acontecer. Alguém mencionou o Linux?


ATUALIZAÇÃO (13 de agosto de 2015)

Um artigo publicado hoje no arstechnica mostra um pouco dos bastidores das comunicações entre o sistema operacional e a Microsoft. A análise foi baseada nos dados fornecidos pelo programa (gratuito) Fiddler Web Debugger.


NOTAS

(¹) Apenas os usuários corporativos têm a opção de adiar as atualizações. Vale notar que, uma vez que os usuários das versões Home e Profissional não têm essa opção, seus sistemas foram automaticamente transformados em cobaias dos usuários corporativos.

ALGUMAS REFERÊNCIAS

Declaração de Privacidade da Microsoft (julho de 2015)
Cortana is Listening
Windows 10 makes diagnostic data collection compulsory
Understanding LTSB and Current Branch in Windows 10
Even when told not to, Windows 10 just can’t stop talking to Microsoft
Softpedia: Stories about Windows 10 privacy

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